“INCONGRUÊNCIA DE GÊNERO NA INFÂNCIA” OU REPATOLOGIZAÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE?

Gays Pela Abolição de Gênero
39 min readFeb 13, 2020

Eugenia Rodrigues[1]* e Gays pela Abolição de Gênero[2]**

[1] * Eugênia Rodrigues é graduada em Comunicação Social, na habilitação Jornalismo, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Seu trabalho de conclusão de curso foi “Fora da caixa: a construção da criança trans no jornalismo brasileiro”. É pesquisadora da área de estudos de mulheres, feministas e de gênero, porta-foz da campanha No Corpo Certo e crítica à medicalização da vida. Contato: eugeniarodriguesrj@gmail.com.

[2] ** Gays pela Abolição de Gênero (antiga Gay AntiQueer) é um coletivo formado por homens gays alinhados por ideais materialistas e abolicionistas que, desde 2015, procura produzir e traduzir conteúdo, aproximando a militância gay de uma visão crítica de gênero. Contato: gayantiqueer@gmail.com.

Nota dos autores

Apoiamos o direito a uma vida digna e saudável para todas as pessoas, respeitando sua autonomia corporal e escolhas enquanto adultas. Portanto, a questão discutida neste trabalho deve ser tratada com extrema delicadeza. Nosso intuito é promover uma reflexão e levantar hipóteses sobre como tem sido abordada a “incongruência de gênero” a fim de abrir espaço para uma discussão crítica de possibilidades. As respostas para nossas indagações não são fechadas e requerem atenção a estudos futuros. É imprescindível mencionar a importância do acolhimento por parte das famílias de crianças cujos comportamentos não se enquadrem nos estereótipos vigentes, pensando sempre no bem-estar destes jovens em situação de vulnerabilidade psicossocial.

Resumo

Tem-se notado em diversos países, entre eles o Brasil, um aumento do número de crianças e adolescentes diagnosticados com “incongruência de gênero” (termo atual para condições que já foram nomeadas genericamente como “inversão sexual”, “transexualismo”, “disforia de gênero” e “transtorno de identidade de gênero”). Paralelamente, as vendas de medicamentos utilizados como bloqueadores da puberdade em crianças com esses diagnósticos também têm aumentado expressivamente. Entretanto, estudos de longa duração revelam o desaparecimento desses sintomas após a puberdade e a homossexualidade como características predominantes entre os pacientes. Tão recente quanto a despatologização da homossexualidade, em 1973, data o reconhecimento do “transtorno de identidade de gênero” na infância. Este trabalho busca investigar a correlação entre a medicalização de comportamentos infanto-juvenis desviantes do sistema de gênero vigente e a medicina como instrumento de normatização.

Palavras-chave: Crianças transgênero. Homossexualidade. Patologização.

“GENDER INCONGRUENCE OF CHILDHOOD” OR REPATHOLOGIZATION OF HOMOSSEXUALITY?

Abstract

In several countries, including Brazil, there has been an increase in the number of children and adolescents diagnosed with “gender incongruence” (current term for conditions that have been generically referred to as “sexual inversion”, “transsexualism”, “gender dysphoria” and “gender identity disorder”). At the same time, sales of drugs used as puberty blockers in children with these diagnoses have also increased significantly. However, long-term studies show disappearance of these symptoms after puberty and homosexuality as predominant characteristics among patients. As recent as the depatologization of homosexuality, in 1973, there was the recognition of “gender identity disorder” in childhood. This paper aims to investigate the correlation between the medicalization of deviant child behaviors from the current gender system and medicine as an instrument of normatization.

Keywords: Transgender children. Homosexuality. Pathologization.

1 Introdução

O aumento do número de crianças e adolescentes diagnosticados com “incongruência de gênero” é expressivo, chegando a cem vezes, entre 2009 e 2016 no Reino Unido (DE GRAAF et al., 2018). Consequentemente, as vendas do SUPPRELIN®, um medicamento utilizado como bloqueador da puberdade — quando ocorrem, entre outras mudanças fundamentais no organismo, o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários como crescimento dos seios e menstruação em meninas, ou barba e engrossamento da voz em meninos — aumentaram 800%, entre 2010 e 2018 (ENDO PHARMARCEUTICALS, 2010, 2019).

Por outro lado, estudos de longa duração observam o desaparecimento da disforia de gênero após a puberdade em 70% dos pacientes (STEENSA; COHEN-KETTENIS, 2015) e a predominância da homossexualidade entre eles, superando os 60% (AITKEN et al., 2015). Um fato significativo é relatado pelo teórico queer Giancarlo Conejo (2011) em seu artigo denominado “A guerra ao menino afeminado”. Conejo, que é gay, relata que foi levado a psicólogos por seus pais, ansiosos por uma “cura” para seu “afeminamento” e que recebeu um diagnóstico de “transtorno de identidade de gênero”. Relatos similares são feitos por transexuais adultos, conforme veremos adiante. Como indaga Kreher (2016), estaríamos expondo lésbicas, gays e bissexuais adolescentes a intervenções médicas desnecessárias, pautadas por estereótipos de gênero? Este trabalho realiza uma análise inicial multidisciplinar destes fenômenos, passando pela história da patologização da homossexualidade no final do século XIX (JEFFREYS, 2003; TREVISAN, 2000) até os critérios internacionais atuais para o diagnóstico de incongruência de gênero adotados no país, inclusive pela Sociedade Brasileira de Pediatria. É fundamental, portanto, uma reflexão sobre os efeitos e riscos destas políticas para crianças e adolescentes fora do padrão, resguardando o direito de pessoas adultas à sua autonomia corporal.

2 Histórico da questão

Tratar como uma condição médica comportamentos que fogem às normas sociais vigentes não é algo recente: no século XIX, a medicina e a psicologia já se empenhavam em corrigir o comportamento das mulheres e homens desviantes — inclusive sua sexualidade. A publicação do Psychopatia Sexualis, de Henrich Kaan, em 1846 inaugura um domínio médico-psicológico das chamadas perversões, que ocuparia o lugar das velhas categorias de devassidão e sodomia (FOUCAULT, 1978). Na tentativa de explicar o comportamento homossexual masculino, o jurista alemão Karl Heinrich Ulrichs, talvez o primeiro ativista gay, postulou que certos homens teriam “almas femininas presas em corpos masculinos”, afirmando assim o desejo por homens como essencial — e necessariamente — de ordem feminina (HERDT, 1993). Magnus Hirschfeld, médico e fundador da primeira organização pelos direitos homossexuais em 1897 na Alemanha, também teorizou sobre a homossexualidade a partir da ideia de uma “inversão sexual”, de homens “femininos” pertencentes a um “terceiro sexo” (STEAKLEY, 1997).

[…] de acordo com declarações de seus parentes, não era como os outros meninos. Sua indisposição para atividades masculinas e sua preferência por divertimentos femininos começaram bem cedo. Assim, ele evitava todos os jogos de menino e exercícios de ginástica, enquanto brincar de bonecas e outras ocupações femininas eram particularmente agradáveis a ele […]. Sexualmente, o paciente sentia como uma mulher para os homens, e tinha inclinações por pessoas de seu próprio sexo […]. Também sua aparência externa, hábito, formas, costumes e vestiários são notáveis, e decididamente lembram forma e características femininas. Essa impressão de uma mulher vestida de homem é ainda maior por um crescimento fino de pelos no rosto, que são raspados, com exceção de um pequeno bigode […]. Opinião: 1. Sr. V. H. é uma pessoa anormal e com um defeito de origem. Seu instinto sexual contrário representa uma parte de sua condição física e mental anormal; 2. Esta situação, na medida em que congênita, é incurável. Existe uma organização deficiente dos maiores centros cerebrais, o que o torna incapaz de viver uma vida independente. Seu instinto sexual perverso o impede de exercer as funções sexuais normais […]. (KRAFFT-EBING, 1892 apud SIMIÃO, 2015, p.189–191)

Nota-se, no relato acima, os processos de medicalização e patologização entrelaçando-se no diagnóstico. A medicalização da sociedade, ensina Ivan Ilitch, consiste num processo em que a área de atuação da medicina se alarga ao ponto de constituir uma forma de violência sobre o indivíduo (ILITCH, 1975). Coloca-se no campo da medicina a origem e a solução de um problema que não é — ou que, a princípio, não seria — médico. No exemplo acima, a homossexualidade, as preferências por certos brinquedos e jogos na infância e algumas características externas são apontadas como tendo origem numa suposta “organização deficiente dos maiores centros cerebrais”. O “tratamento” indicado, felizmente, não foi dos mais extremos: o médico entendeu que bastava que o sr. V.H. vivesse “sob o cuidado e conselho de indivíduos normais”. Há de se observar que o termo “medicalização” sugere um processo que pertence ao exercício da medicina, enquanto que essa perspectiva é, cada vez mais, difundida por psicólogos (as), psicanalistas, fonoaudiólogos (as), assistentes sociais e por toda a sociedade, de modo que é mais conveniente utilizar o termo “patologização”. O profissional que atendeu ao sr. V.H. patologizou — leia-se, entendeu como elementos caracterizadores de uma patologia, uma doença (física e ou mental) a ser curada — comportamentos que hoje consideramos, ou ao menos deveríamos considerar, normais: o desvio dos padrões impostos a cada sexo e a atração por pessoas do mesmo sexo. A patologização também sugere que haveria uma causa, em geral biológica, para aquele sintoma, que seria preciso se chegar a um diagnóstico e, finalmente, a uma cura (usualmente através da prescrição de fármacos e/ou de cirurgias). Esse processo, no sistema capitalista, está subjugado aos interesses da indústria médico-farmacêutica.

A partir dessa visão de mundo e de técnicas que se aperfeiçoariam ao longo dos anos, iniciam-se, então, experimentos científicos para corrigir o comportamento homossexual, utilizando-se de lobotomia, castração física e química, enxertos de órgãos, transplantes de testículos, terapia eletroconvulsiva e medicamentos hormonais (BLAKEMORE, 2019; OVERWHELMED, 2017). A história das intervenções médicas em homossexuais se confundiria com as daqueles que Magnus Hirschfeld nomearia de “transexuais”. Magnus participaria indiretamente das primeiras cirurgias de readequação genital, praticadas como uma cura para estes “doentes” (KHAN, 2016). No ano de 1952, três fatos acontecidos na Inglaterra e nos Estados Unidos marcam a continuidade da medicalização da homossexualidade: no primeiro país, a descoberta da orientação sexual do cientista Alan Turing ensejou sua condenação por “grave indecência”. Figura central para a vitória dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, ele foi obrigado a aderir ao “tratamento médico” com hormônios femininos, que visavam a diminuir seu desejo indevido e a modificar seu corpo para assemelhá-lo ao do sexo que é autorizado a se relacionar com homens. Turing ficou impotente, lhe cresceram seios e ele morreria dois anos depois envenenado — especula-se que por suicídio. No mesmo ano, nos EUA, a Associação de Psiquiatria Americana patologizou formalmente a homossexualidade listando-a como um transtorno mental e a mídia celebrou a primeira pessoa norte-americana a se submeter a uma cirurgia de “mudança de sexo”: Christine Jorgensen. Christine, que em alguns depoimentos se descreve como “um homossexual masculino” (JEFFREYS, 2014), se submeteu ao protocolo elaborado pelo médico dinamarquês Christian Hamburger (KHAN, 2016).

Influenciado por Hamburguer e por Hirschfeld, com quem havia convivido diretamente, e à vista da grande procura de norte-americanos pela nova “cura”, o endocrinologista Harry Benjamin começou a atender a este grupo e em 1967 publicaria o livro The Transexual Phenomenom, que se tornou referência para o que hoje se conhece como “processo transexualizador” nos Estados Unidos e no resto do mundo. Nele, defende-se por princípio o uso de hormônios artificiais e cirurgias como possível cura para o “transexualismo” (BENJAMIN, 1967). O uso de hormônios como “tratamento” chegaria à África do Sul: durante o período do apartheid (1948–1994), homossexuais foram castrados quimicamente com doses massivas de hormônios e, entre 1969 e 1987, cerca de 900 homens e mulheres foram submetidos à cirurgia de redesignação de gênero em hospitais militares (KAPLAN, 2004). A patologização da desviância atingiria crianças e adolescentes, seja ao se considerar a infância fora do padrão dos pacientes como sintoma de uma patologia, como no citado caso do “sr. V.H”, seja para celebrar a “cura” de um menino “afeminado” através da terapia de modificação comportamental, como fez o psicólogo norte-americano George Alan Rekers (RECKERS, 1974).

Esses parâmetros guiariam não apenas médicos (psiquiatras, endocrinologistas, cirurgiões plásticos) mas também psicólogos — a medicalização, repita-se, não é um processo exclusivo de profissionais da medicina. À rigidez dos padrões de comportamento para o sexo do século XIX, o psicólogo John Money oporá a bebês intersexuais a plasticidade tecnológica do que ele denominará “gênero”. Money utiliza pela primeira vez sua noção de gênero em 1947 e a desenvolve clinicamente mais tarde com Anne Ehrhardt e Joan e John Hampson para falar da possibilidade de modificar hormonal e cirurgicamente o “sexo” dos bebês nascidos com órgãos genitais e/ou cromossomos que a medicina, com seus critérios visuais e discursivos, não pode classificar somente como femininos ou masculinos. O neozelandês, que viveria a maior parte da vida nos Estados Unidos, conceitua gênero para nomear o “sexo psicológico; pensa sobretudo na possibilidade de utilizar a tecnologia para modificar o corpo segundo um ideal regulador preexistente que prescreve como deve ser um corpo humano feminino ou masculino” (PRECIADO, 2008, p. 81).

Em 1973, após longa luta, a homossexualidade deixou de ser listada oficialmente como uma patologia pelo Manual de Diagnóstico e Estatística dos Estados Unidos. Contudo, sete anos depois, o mesmo documento passou a reconhecer o chamado “transtorno de identidade de gênero” (gender identity disorder, GID) na infância. Rapidamente, esse diagnóstico passou a ser aplicado a crianças cujos comportamentos não se enquadravam nas rígidas normas. A prescrição de medicamentos e cirurgias partem de diagnósticos médicos; assim, se ao longo do século XX quase não há registros de menores de idade sendo encaminhados para “terapia hormonal”, isso mudaria na virada do século. Em 2006, foi publicado o primeiro estudo acerca do uso de uma substância inibidora de hormônios gonadotrópicos, a triptorrelina, na inibição da puberdade de crianças e adolescentes fisicamente saudáveis que receberam diagnósticos de “disforia de gênero” (WAAL et al., 2006). A partir dessa experiência, outras substâncias com efeitos semelhantes seriam utilizadas com a mesma finalidade como a histrelina, a leuprorrelina e a goserelina. O bloqueio de puberdade para estes fins começou a ser recomendado e utilizado internacionalmente[3] e, em paralelo, iniciou-se também a prática de ministrar a menores de idade uma segunda categoria de hormônios artificiais que já era aplicada em adultos — os cross-sex hormones ou “hormônios cruzados”, que suprimem as características sexuais secundárias do sexo biológico e induzem características físicas do outro sexo.

A medicina e psicologia brasileira seguirão as tendências estrangeiras ao longo do século XX e XXI (TREVISAN, 2000). No alvorecer do XXI, John Green relata o caso de Marina:

Nascido com genitais masculinos, mas sexualmente atraído por outros homens, alguns pensavam que sua essência, alma, espírito, ou pensamento eram, na verdade, femininos, e estavam encarcerados erroneamente num corpo masculino. Nem sua provável formação católica, ou meio social em que foi criado no Brasil rural, nem o aconselhamento médico ofereceram a Marina um modelo alternativo para construir sua identidade sexual e social. Seu desejo de servir, de assumir o papel tradicional da mulher num relacionamento, parecia-lhe a única opção disponível. (2000, p. 136–137)

Em 2008 e 2013 o Brasil criou e ampliou o financiamento público do chamado “processo transexualizador” (Portarias nº 1.707/2008 e nº 2.803/2013 do Ministério da Saúde) estabelecendo a idade mínima de 18 anos para os pacientes se submeterem aos hormônios e 21 às cirurgias irreversíveis. No mesmo ano de 2013, o Conselho Federal de Medicina, baseando-se em estudos estrangeiros, emitiu o Parecer n.º 8/2013, sugerindo o bloqueio da puberdade de crianças diagnosticadas com o que denominava à época “transtorno de identidade de gênero” tão logo surjam os primeiros sinais de amadurecimento físico e recomendando a administração de hormônios cruzados para adolescentes a partir dos 16 anos. Em 2017, a adoção dos critérios internacionais para o diagnóstico de disforia de gênero na infância e adolescência foi sugerida pelo Manual para Disforia de Gênero da Sociedade Brasileira de Pediatria, critérios esses que incluem a preferência por brinquedos e roupas socialmente atribuídos ao outro sexo:

Em meninos (gênero designado), uma forte preferência por cross-dressing (travestismo) ou simulação de trajes femininos; em meninas (gênero designado), uma forte preferência por vestir somente roupas masculinas típicas e uma forte resistência a vestir roupas femininas típicas […] Em meninos (gênero designado), forte rejeição de brinquedos, jogos ou atividades tipicamente masculinas e forte evitação de brincadeiras agressivas e competitivas; em meninas (gênero designado), forte rejeição de brinquedos, jogos e atividades tipicamente femininas. Forte desgosto com a própria anatomia sexual. (SBP, 2017, p. 5)

Em 2018, o Conselho Federal de Psicologia, a exemplo de outros países, publica a Resolução n.º 1/2018, que penaliza profissionais que questionem identidades de gênero. Finalmente, em janeiro de 2020, o Conselho Federal de Medicina publicou a Resolução nº 2265/2019, reiterando a sugestão de intervenções hormonais em menores de 18 anos e recomendando a redução da idade mínima para cirurgias de 21 para 18 anos.

3 O que os estudos nos mostram

A partir do final dos anos 1960, começam a ser publicados estudos de longa duração acerca de crianças e adolescentes atendidos para o que atualmente a Organização Mundial de Saúde e o Manual de Diagnóstico em Saúde Mental (DSM) denominam “incongruência de gênero”.

3.1 O aumento no número de diagnósticos

Dados do Brasil e do mundo vêm mostrando um aumento considerável no número de diagnósticos e atendimentos para as condições supracitadas em todas as idades.

No cenário internacional, destaca-se um aumento de 400% no número de diagnósticos para disforia de gênero em crianças e adolescentes entre 1980 e 2008 no Canadá (WOOD et al., 2013) e, também, lá, um aumento de 500% nos casos entre 1998 e 2011 (KHATCHADOURIAN, 2014).

Nos Estados Unidos, o número de crianças que se identifica como trans aumentou de 0,7% para 3% entre 2017 e 2018 (MEERWIJK et al., 2017; RIDER et al., 2018). Na Inglaterra, houve um aumento de 1000% (mil por cento) no número de diagnósticos entre 2009 e 2016 (DE GRAAF et al., 2018) e os casos quadriplicaram entre 2013 e 2018 (TURNER, 2018). Na Suécia, foi reportado um aumento de 900% entre 2011 e 2016 (FRISÉN; SÖDER; RYDELIUS, 2017).

No Brasil, foi registrado aumento de 32% nos atendimentos ambulatoriais para o protocolo transsexualizador, passando de 3.388 em 2015 para 4.467 entre 2015 e 2016, o número de cirurgias de transgenitalização do sexo masculino para o feminino cresceu 48% (de 23, em 2015, para 34 em 2016) e a chamada terapia hormonal também subiu de 52 para 149 procedimentos, num aumento de 187%. (BRASIL, 2017). Em 2017, o Ambulatório de Identidade de Gênero da USP informa aumento de 60% na procura e que “a busca é maior por parte de famílias de crianças entre 5 e 12 anos” (FARIAS, 2016). Finalmente, em 2019, após a flexibilização para mudanças em documentos, o número de pedidos para inclusão do nome social no Estado de São Paulo disparou: em menos de 30 dias da nova regulamentação, foram feitos quatro pedidos para crianças entre 5 e 10 anos, sete para a faixa etária de 11 a 16 e 45 com idades entre 17 e 21 anos (LEITE, 2019).

3.2 Sobre a persistência para os diagnósticos

Uma série de estudos indica que as taxas de persistência para este tipo de diagnóstico, historicamente, são baixas; a maioria dos casos se resolve após a puberdade. A exceção, conforme será apontado nas considerações finais, reside nas crianças e adolescentes que receberam bloqueadores de puberdade.

Em 2008, um estudo mostrou uma variação na persistência do transtorno de identidade de gênero após a puberdade de 2,5% a 20%, ou seja, na maioria dos casos, o transtorno desaparece antes da puberdade (KORTE, 2008).

No levantamento de Steensma et al., realizado em 2011, foram analisados 10 estudos realizados entre 1968 e 2008 que revelaram que, de um total de 246 crianças, apenas 39 delas mantiveram a disforia. A taxa geral de persistência foi de apenas 16% e variou entre os diferentes estudos de 2% a 27%. Ou seja, entre 73% e 98% das crianças acompanhadas pararam de se sentir disfóricas após a puberdade. O estudo ainda se colocou fortemente contra a chamada “transição social” (mudança de nomes, pronomes, documentos etc.) para crianças menores de 10 anos, argumentando que, a partir dos dados levantados, ela diminui as chances de desistência (STEENSMA et al., 2011).

A pesquisa de Singh (2012) mostra que apenas 12% dos nascidos meninos estudados tiveram persistência para identificação como transexual após seus 17 anos, o que endossa a afirmação de Steensma et al. (2013) de que a puberdade é um fator de resolução para os diagnósticos em 84,2% dos casos analisados.

Por fim, Steensma et al. (2015) revelaram que 70% das crianças diagnosticadas não retornaram à clínica e à transição.

3.3 A relação com a homossexualidade

Parece existir uma sobreposição entre a orientação sexual e estes diagnósticos. Em sua revisão, Nucci (2009) encontrou quinze artigos publicados entre 1977 e 2006 que estabeleciam uma relação entre a homossexualidade e a bissexualidade na vida adulta e a não conformidade de gênero na infância, destacando que as dimensões da orientação sexual e de gênero são, para parte significativa dos pesquisadores, interligadas:

Nesses estudos, o “comportamento atípico” em crianças é pensado pelos autores como um indicador, na infância, de uma possível homossexualidade na vida adulta. Tal teoria, como vimos anteriormente, está ancorada na associação entre gênero e preferência sexual, onde ser homem é igual a ser heterossexual, e a preferência heterossexual é signo de masculinidade. Como consequência, o homem homossexual seria de algum modo feminino (neste caso, seu comportamento na infância seria “feminino”) e a mulher homossexual, da mesma forma, seria masculina.

Também no ano de 2008, estudos longitudinais forneceram evidências de que o comportamento atípico de gênero na infância é correlacionado à orientação homossexual na idade adulta (KORTE, 2008).

Wallien (2008) afirmaria que “no que diz respeito à orientação sexual, o resultado mais provável da GID infantil seria a homossexualidade ou a bissexualidade na vida adulta e não a transexualidade”. Em um estudo, 70% das meninas diagnosticadas e 67,7% dos meninos foram classificados como homossexuais (WOOD et al., 2013).

Outra pesquisa mostraria que maioria dos indivíduos estudados exibiu atração pelo mesmo sexo na adolescência ou idade adulta (HEYLENS et al., 2012).

Numa outra ocasião, o percentual de pacientes que não se declaravam como heterossexuais foi superior a 60% (AITKEN et al., 2015; LITTMAN, 2018).

Reckers (1972) concentrou sua pesquisa de doutorado no tratamento de meninos “femininos”. Neste trabalho, ele cataloga uma série de “comportamentos femininos” como postura “feminina”, marcha, gestos de braço e mão, inflexão na fala e interesse em roupas, jogos e tópicos de conversação considerados típicos do sexo femininos.

Em 2005, Zucker e Spitzer argumentaram contra a ideia de que os diagnósticos para GID seriam uma forma de continuar a patologização da homossexualidade. Para os autores, a inclusão do novo diagnóstico teria sido feita pelos mesmos membros do comitê que lutaram pela remoção da homossexualidade do DSM-II e, portanto, não faria sentido que o intuito fosse esse. Apesar disso, eles reconhecem que, já em 2005, em alguns casos os diagnósticos para GID foram utilizados como argumento para “tratar” a homossexualidade precocemente (PLEAK, 1999; ZUCKER; BRADLEY, 1995; DE AHUMADA, 2003; NICOLOSI; NICOLOSI, 2002).

3.4 A disforia e as nascidas meninas

Um aumento no número de casos entre pacientes do sexo feminino também chama a atenção. Wood já apontava para um aumento de 400% no número de casos de disforia no sexo feminino (WOOD et al., 2013).

Em 2015, mais um estudo canadense mostraria um aumento local no número de diagnósticos em adolescentes do sexo feminino, assim como verificado em 2013 (AITKEN et al., 2015). Em 2018, no Reino Unido, dos 256 casos analisados, 83% eram meninas (LITTMAN, 2018).

No mesmo ano, um grupo finlandês que observou a mesma desproporção reconheceu uma prevalência de comorbidades psíquicas e psiquiátricas em seus pacientes, de ambos os sexos (KALTIALA-HEINO, 2015).

Observou-se, também, que mais meninas persistiram em seus diagnósticos e entraram de fato em transição: 38,5% das meninas contra 27% dos meninos (STEENSA; COHEN-KETTENIS, 2015).

Dos indivíduos que deixaram de apresentar o diagnóstico, uma porção significativa — todas as mulheres e metade dos homens — passou a expressar orientações não heterossexuais (VAN SCHALKWYK et al., 2015).

Milrod e Karasic destacaram, em 2017, que um número crescente de adolescentes do sexo feminino está recebendo hormônios análogos ao liberador de gonadotropina na infância e puberdade e, posteriormente, hormônios do sexo oposto, tendo a mastectomia e a faloplastia como possibilidades ao completarem 18 anos. Há registros de cirurgias transexualizadoras sendo realizadas antes dessa idade, violando os padrões de atendimento da própria Associação Profissional Mundial para a Saúde Transgênero (WPATH) (MILROD, 2017).

A psicóloga Lisa Marchiano (2017) se posicionou criticamente à transição infantojuvenil denunciando que adolescentes de 14 anos estão passando por processos de mastectomia (ROWE, 2016) e que um médico prescreveu a uma menina de 12 anos hormônios do sexo oposto por ela se recusar a usar vestidos (LYONS, 2016).

Aitken et al. (2015) também apontam uma mudança na proporção entre meninos e meninas na busca por tratamento da incongruência de gênero. Até 2006, tinha-se uma maioria de meninos (sexo biológico), invertendo-se o cenário, de 2006 a 2013, para uma prevalência de meninas.

De Graaf e colaboradores (2018) encontraram um número ligeiramente maior de meninos, 50,6%, (2000–2017), mas esse número representa uma diminuição de 20% do período anterior (2000–2006)

3.5 Comorbidades

Estudos apontam que diagnósticos de incongruência de gênero têm sobreposição com outras comorbidades. No período da infância e adolescência destacam-se distúrbios alimentares, e também diagnósticos para o espectro autista.

Em 62% dos casos, a pessoa havia sido diagnosticada anteriormente com algum tipo de transtorno mental (LITTMAN, 2018).

Campo et al. (2003) revelam que 61% dos pacientes com transtorno de identidade de gênero tinham outras comorbidades psiquiátricas, sendo a identidade de gênero um problema secundário aos outros transtornos presentes.

Khatchadourian (2014) verificou que, dos pacientes com incongruência de gênero, 35% tinham algum distúrbio de humor (20 do sexo feminino e 9 do sexo masculino), 24% tinham transtorno de ansiedade (15 do sexo feminino e 5 do sexo masculino), 10% tinham TDAH (2 do sexo feminino e 6 do sexo masculino), 7% tinham um indicativo de que estariam no espectro do autismo (2 do sexo feminino e 4 do masculino), 5% tinham algum distúrbio alimentar (2 do sexo feminino e 2 do sexo masculino), 7% de seus pacientes tinham algum problema de abuso de substâncias (2 do sexo feminino e 4 do masculino), e 26% de seus pacientes tiveram dois ou mais diagnósticos de problemas de saúde mental (12 do sexo feminino e 10 do sexo masculino).

Embora disforia de gênero e distúrbios alimentares não sejam entendidos clinicamente como um mesmo fenômeno, a associação e sobreposição entre tais diagnósticos foi observada por Coutrier et al. (2015), Hepp et al. (2004), Khatchadourian (2014), Walter e Whitehead (1997), Nelson (2012) e Strandjord (2015).

Também foi encontrada sobreposição com o espectro autista por Williams et al. (1996), Vermaat et al. (2018), Abelson (1981), Landpen e Rasmussen (1997), Meyenburg (2014), van der Miesen et al. (2018), Mukaddes (2012) e Tateno (2015; 2008).

Em 2018, uma revisão mostrou que 35% dos pacientes atendidos na clínica de identidade de gênero londrina Tavistok — de um total de mais de 1000 menores atendidos lá desde 2001 — tinham traços de autismo (ADAMS, 2018).

Finalmente, o Guia da Sociedade Brasileira de Pediatria admitiu:

Sabe-se que os transtornos de humor, transtornos de personalidade, uso e abuso de drogas e ansiedade são mais frequentes entre sujeitos com o diagnóstico de disforia de gênero, quando comparados com a população geral. O comportamento suicida também é maior, independentemente da presença de qualquer comorbidade psiquiátrica. (2019, p. 4)

3.6 Sobre raça e etnia

Dados demográficos oficiais para esta população ainda são escassos, principalmente para o Brasil. Entretanto, nos EUA, Flores et al. (2016) encontraram que as pessoas adultas que se identificam como trans tinham maior probabilidade de pertencer a minorias étnicas e raciais, principalmente de origem latina, do que a população adulta em geral. Esses dados falam especificamente da população adulta; por isso, podem não representar a situação dos jovens e crianças medicalizados aqui retratada. Também nos EUA, Rider (2018) encontrou que jovens de minorias étnicas representavam 41,3% daqueles em desconformidade de gênero, contra 28,5% dos demais, o que sugere que o desconforto com a identidade de gênero possa ser agravado por questões étnico-raciais.

4 Possíveis causas e efeitos

4.1 Cobertura midiática

Os meios de comunicação são responsáveis por formação de opinião, direcionamento de consumo e influência no comportamento de crianças, adolescentes e adultos. A abordagem da questão da incongruência de gênero, cada vez mais frequente na mídia, não foge a essa regra, contribuindo significativamente para o aumento do número de casos observado. Littman (2018) destacou como fator importante a exposição à internet e também chamou a atenção para o fato de que 37% dos casos faziam parte de grupos de amigos em que havia mais de um caso de disforia de gênero. A cobertura midiática, inclusive no Brasil, costuma acatar acriticamente as falas de médicos das especialidades beneficiadas pelo processo transexualizador, reproduzir estereótipos sexistas e negligenciar aspectos fundamentais da questão como os efeitos colaterais dos hormônios (RODRIGUES, 2017).

4.2 As “regras do jogo”

As rígidas normas sociais para cada sexo biológico, as quais poderíamos aqui conceituar resumidamente como “gênero”, são uma gama de rituais e símbolos complexos. Seu entendimento por parte de crianças e adolescentes é parte de um processo de individualização e subjetivação. É esperável que existam períodos de desacordo e confusão acerca dos mesmos principalmente com as mudanças fisiológicas intensas da puberdade e a forma como isso afeta a percepção do próprio corpo pode ser decisiva. Em entrevista à revista Crescer concedida em 2019, a psicóloga Elaine Di Sarno afirma:

Atualmente, as crianças tendem a observar e perceber como as diferentes características físicas são vistas pela sociedade, o que pode resultar na construção de um ideal, à medida que abstraem conceitos do que é valorizado como atraente, bem como do que tende a ser “rejeitado” na aparência física. Essa percepção voltada aos corpos dos outros e ao seu próprio corpo podem vir a gerar a satisfação ou insatisfação corporal, desde a infância.

Em 2019, o Dr. Marcus Evans pediu uma supervisão externa da Clínica Tavistock, em Londres, na qual foi observado um aumento de 400% no número de casos de incongruência de gênero em crianças nos últimos 5 anos (2014–2019) . Ao expor a gravidade da questão, ele destaca que a adolescência e a infância são períodos em que as pessoas se desenvolvem social e biologicamente — um período em que os jovens se identificam com diferentes grupos e com aspectos masculinos e femininos de si mesmos:

Há pressão da criança em estado de angústia, pressão da família e do grupo de colegas e dos lobbies pró-trans — e tudo isso pressiona o clínico que pode querer ajudar o indivíduo a resolver seu estado angustiado, indo junto com uma solução rápida […] Há muita coisa em jogo aqui, pois essas decisões têm consequências de longo alcance. (apud IVES, 2019)

O bullying também é um fator determinante nessa percepção distorcida. Um estudo de 2017 mostrou impactos diretos do bullying homofóbico em crianças como fator decisivo para o surgimento posterior de disforia de gênero (DELAY et al., 2017). O processo de subjetivação que direciona esses jovens para a transexualidade parece, portanto, ter origem extrínseca, na socialização e nos agentes socializadores:

Nenhuma criança se define como transgênero. Ela recebe esse rótulo de adultos, que na maioria das vezes são os próprios pais e, posteriormente, especialistas. As crianças estão amplamente imersas em suas fantasias e podem ter identificações lábeis; é preciso respeitar os movimentos identificatórios delas para poder obter uma saída saudável. (JORGE; TRAVASSOS, 2018, p. 115)

4.3 Heteronormatividade e não conformidade

A tentativa de corrigir comportamentos homossexuais através de tratamentos médicos e psicológicos está pautada por uma visão heteronormativa de ser. Essa conexão entre estereótipos de comportamento de gênero e sexualidade é lembrada em:

As performances de gênero, a sexualidade e a subjetividade são níveis constitutivos da identidade do sujeito que se apresentam colados uns aos outros. O masculino e o feminino só se encontram por intermédio da complementaridade da heterossexualidade. (BENTO, 2010, p. 173)

Exemplos da imposição da heteronorma são trazidos por membros da própria comunidade LGBT. Conejo, por exemplo, relembra:

De fato a psicóloga que mencionei declarou que eu tinha um transtorno de identidade de gênero […] Eu não fui o único patologizado por estes professores, psicólogas e psiquiatras, o foram também meus pais, e especialmente minha mãe. Figuras como as do ´pai ausente´ ou ´mãe super protetora´ não tardaram a aparecer como explicações depois teria que ser explicado meu afeminamento. (2011 apud RODRIGUES, 2017)

A heteronormatividade enquanto um ideal também é encontrada no relato de uma pai que ganhou notoriedade na mídia brasileira por ter uma “filha trans”, atendida no Hospital das Clínicas de São Paulo. Na matéria, ele parece aliviado por descobrir que seu filho não era homossexual mas sim “uma menina no corpo de um menino” (THERRIE, 2017). Vemos essa mesma conexão na obra do ativista trans João W. Nery (2011). No trecho, fica evidente como a construção de sua própria transexualidade residiu em conflitos com sua sexualidade e os estereótipos de gênero:

Adorava as brincadeiras consideradas de menino. Era reprovado. Gostava de me vestir como os garotos, tentando rivalizar e competir com eles. Era ignorado. Tremia e me apaixonava pelas meninas, mas era impedido de me declarar. Meus sonhos eram ser um super-herói, mais tarde casar com uma princesa e ser pai. Era incompreendido. (apud RODRIGUES, 2017)

História semelhante à de João Nery é contada por Jô Lessa, também homem trans. Na adolescência, relatou à mãe seu interesse em uma amiga. As consequências foram traumáticas:

Ela me levou a uma clínica, disse que eu seria atendido por um psicólogo e assim aconteceu. Só que o psicólogo que me atendeu já estava orientado por ela no que fazer, como fazer e fez. […] Eu pensava assim até entender que naquela época eu apresentava sintomas de “homossexualismo”, pois estou relatando acontecimentos entre o final da década de 70 e início dos anos 80, ou seja, ela não precisava orientar o psicólogo para que o mesmo me internasse, esse procedimento constava no CID — Código Internacional de Doenças. (LESSA, 2016)

Jô passou por duas internações em clínicas no Rio de Janeiro, sendo submetido a “tratamentos” degradantes. Amanda Guimarães, youtuber conhecida como Mandy Candy, relata:

Mas os adultos, minha mãe, por exemplo, percebiam que eu não era um menino como meus irmãos. Por mais que eu brincasse de tudo com eles, como subir em árvore, guerrinha, lutinha etc., meu jeito era muito diferente, eu sempre fui muito delicada, meu jeito era feminino. […] E pra piorar tudo na minha cabeça, além da negação do meu corpo masculino, eu também não sentia atração por meninas […]. (2016, p. 19, 30)

Não obstante a lenta e gradual aceitação de gays, lésbicas e bissexuais na sociedade, precisamos ficar atentos para as novas roupagens que a homofobia pode assumir na contemporaneidade. Pelúcio e Miskolci (2009, p. 152) alertam:

O “fantasma” que rondou os leitos lascivos das décadas de 1980 e 90 não perdeu de todo o seu poder de assombro, mas desdobrou-se em muitas fobias materializadas em monstros sociais. Se a homossexualidade foi higienizada, em boa medida controlada em suas expressões mais rebeldes no modelo monogâmico-familiar, agora se avança na patologização de outros comportamentos.

Alguns grupos gays também começaram a se posicionar criticamente a este processo:

Esse processo (de feminilização) parece intensificar-se quando fazemos um recorte socioeconômico dessa situação: quanto mais na periferia, mais o jovem gay é empurrado ao polo de comportamento feminino, ao ponto de muitas vezes ser levado a crer que ele é “uma mulher presa no corpo de um homem”. Feminizar-se é exatamente o que a sociedade espera de nós, para que ela encaixe qualquer discordância com gênero na categoria oprimida e possa perpetuar os dois polos de comportamento que sustentam o patriarcado e a heterossexualidade compulsória. A grande mídia se aproveita disso, ao vender personagens estereotipados em suas produções que só reforçam essa imagem da bicha (GAYS PELA ABOLIÇÃO DE GÊNERO, 2015).

Assim, a feminilidade não é algo natural, nem para mulheres e nem para homens. Para Judith Butler (1993) “a feminilidade não é, então, a consequência de uma escolha, mas a citação forçada de uma norma, cuja complexa historicidade é indissociável de relações de disciplina, regulação, punição” ( apud SALIH, 2002, p. 125).

Ainda faltam mais dados sobre o fenômeno conhecido como “destransição” ou a reversão do processo de “transição de gênero”, mas Charlie Evans, jovem destransicionada e ativista lésbica, fundou a “A Rede de Defesa da Destransição” (“The Detransition Advocacy Network”) e afirma que o grupo tem sido procurado por centenas de pessoas nessa situação (apud SCULLY, 2019). Segundo ela:

Jovens lésbicas são excepcionalmente vulneráveis a esse tipo de ideologia, particularmente porque muitas apresentarão inconformidade de gênero. Somada à opressão do sexo feminino como um todo, muitas jovens lésbicas satisfarão os critérios necessários para utilizarem bloqueadores de puberdade a partir dos dez anos de idade. Existe alguma surpresa em um mundo que oprime lésbicas e idolatra homens heterossexuais que tantas meninas queiram ser homens? (EVANS, 2019)

Evans, em outro texto, revela seu temor em relação aos direitos das mulheres:

Esta não é a única forma em que corpos femininos são alterados pelo bisturi a fim de ajustá-los. Há enormes violações de direitos humanos de mulheres e meninas pelo mundo assim. Porém, poucas são encorajadas, mantidas, ou mesmo prescritas, pelos serviços de saúde e escolas e política governamental. Eu suspeito que essa seja a única violação como tal que é celebrada como progressista e liberal. Por isso é tão aterrorizante. (EVANS, 2019)

4.4 Padrões corporais e as nascidas meninas

Embora o maior número de transexuais representados na mídia seja do sexo masculino (mulheres trans) (GLAAD, 2018), o que os dados revelam é que isso vem mudando. Todos os estudos supracitados apresentam um crescimento no número de indivíduos do sexo feminino diagnosticados com incongruência de gênero. Em seu trabalho, Aitken et al. (2015) creditam isso ao fato de que a transição seria mais aceita em fêmeas, já que, segundo eles, haveria um custo social menor em ser homem trans. Contraditoriamente, os autores também argumentam que homens são mais intimidados quando “afeminados” do que mulheres por serem “masculinizadas” e que isso poderia afetar as decisões de transição.

Em 2016, em sua revisão denominada Será que os diagnósticos para transgeneridade na juventude colocam gays, lésbicas e bissexuais adultos em risco de intervenção médica desnecessária?, Kreher destaca a permissividade de médicos e pesquisadores destes estudos para com a questão e levanta algumas possíveis explicações para o fenômeno:

Eu argumentaria que foi negligente por parte dos autores deste estudo sequer considerar essa mudança de contexto com o fato de que as mulheres experimentam significativamente mais ódio em relação ao próprio corpo do que os homens. Isso se manifesta em mais cortes, dietas, anorexia, bulimia e cirurgia plástica. Labioplastia agora está se tornando mais popular entre adolescentes e mulheres jovens, de modo que seus órgãos genitais possam estar em conformidade com representações da pornografia. Todos estes comportamentos no sexo feminino costumavam ser inexistentes ou raros, mas tornaram-se populares através do contágio social devido ao aumento da atenção da mídia. Eu não estou dizendo que anorexia é o mesmo que disforia de gênero. Há semelhanças e há grandes diferenças.

É importante destacar que os índices de dismorfia corporal em crianças é 7 vezes maior em meninas do que em meninos (NHS DIGITAL, 2017), o que indica uma maior vulnerabilidade do sexo feminino à pressão por normatizações em relação aos seus corpos. A organização australiana Pretty Foundation, que busca promover a autoestima em meninas, aponta dados preocupantes: 38% das meninas de 4 anos se sentem insatisfeitas com seus corpos, 34% das meninas de 5 anos sentem vontade de fazer dieta e 68% delas já sofreu bullying por sua aparência física (2019). Ao passo que traços dessa visão distorcida do próprio corpo são assimilados à construção da feminilidade, isso também afeta jovens não-heterossexuais em conflito com essas normas. Rapazes gays e bissexuais relataram três vezes mais problemas relacionados a distúrbios alimentares do que os heterossexuais, e o mesmo estudo ainda mostrou que não há diferenças significativas entre moças heterossexuais e lésbicas e bissexuais na prevalência de qualquer um dos transtornos alimentares (FELDMAN, 2017).

4.5 Medicalização e mercado

Os efeitos colaterais dos hormônios artificiais que conferem características do outro sexo são conhecidos há décadas[4]* e, em relação aos que bloqueiam o amadurecimento dos corpos infantojuvenis,

Os bloqueadores de puberdade são indicados para o tratamento da puberdade precoce, porém ainda não é possível afirmar se são seguros para a fisiologia de crianças com saúde normal que apresentam disforia de gênero. O estudo com hormônios antagônicos em adultos revelou uma propensão ao desenvolvimento de doenças cardíacas, hipertensão arterial, trombose, acidentes vasculares, diabetes e câncer. (JORGE; TRAVASSOS, 2018, p. 114)

Além dos efeitos adversos, é impossível não registrar que pacientes que emendem o bloqueio puberal com os hormônios cruzados e, obviamente, os que se submetam a cirurgias de redesignação sexual, ficam permanentemente estéreis. Retomando um olhar histórico sobre a eugenia, reconhecemos o padrão de impedir que indivíduos com determinadas características físicas, mentais e comportamentais deixem descendentes. Um trabalho de 2013 já chamava a atenção para as complexidades ofuscadas por essa narrativa “de salvar as crianças do iminente desastre da puberdade” (SADJADI, 2013).

Apesar de muitas vezes ter seu pensamento utilizado como forma de justificar a noção de transsexualidade, Judith Butler se manifestou sobre a “disforia de gênero” na infância, citando o psiquiatra Richard Isay, referência em sexualidade e ele mesmo homossexual:

O diagnóstico, por si só, ele escreve, “pode causar dano emocional por ferir a autoestima de uma criança que não tem nenhum transtorno mental”. Isay aceita o argumento de que muitos jovens gays preferem, quando crianças, o assim chamado comportamento feminino, brincando com as roupas da mãe, recusando-se a participar de atividades rudes e conturbadas; no entanto, ele afirma que o problema aqui não se deve às características, mas às “repreensões dos pais, […] visando a modificar esse comportamento, que teriam efeito deletério sobre a autoestima desses garotos”. A solução que ele propõe é que os pais aprendam a dar apoio ao que ele chama de “características atípicas de gênero”. (2009, p. 103)

Atualmente, as principais substâncias utilizadas com a finalidade de bloquear a puberdade são a histrelina e leuprorrelina. Dentre os medicamentos cujo princípio ativo é a histrelina, os mais vendidos nos EUA são o VANTAS® e o SUPPRELIN®, segundo a PharmaCompass (2018). De acordo com o relatório anual da companhia, a receita com as vendas do SUPPRELIN® aumentaram 800% entre o período de 2010 e 2018 (ENDO PHARMARCEUTICALS, 2010; 2019). Ou seja, o aumento da prescrição e venda destes medicamentos acompanhou o aumento do número de diagnósticos para “TIG”/”disforia de gênero”/”incongruência de gênero” no mesmo período. E embora bloquear a puberdade de crianças rotuladas como trans não seja o único uso previsto para tais substâncias, há uma publicidade massiva na mídia para estas intervenções, as quais no Brasil, são oferecidas gratuitamente nos ambulatórios de identidade de gênero.

A quem interessa diagnosticar a desviância? A quem interessa patologizar como “incongruentes” meninos e meninas com determinadas preferências de brinquedos, vestuário e amizades? A quem interessa medicalizar a homossexualidade, modificando, por vezes de maneira irreversível, os corpos de gays e lésbicas e esterilizando-os antes que cheguem à idade adulta? À erradicação da homossexualidade visível, para que estes indivíduos sejam vistos como heterossexuais? Quem protege o menino que brinca de ser princesa e a menina que se recusa a usar vestidos? A quem interessa a manutenção de homossexuais como nichos de mercado de profissionais de saúde e laboratório, sejam os homossexuais reais, sejam os assim presumidos na infância por conta dos comportamentos desviantes? Para Sheila Jeffreys e Lawrence Mass, através do diagnóstico de “transtorno de identidade de gênero” em crianças e adolescentes, a psiquiatria norte-americana continua sutilmente engajada em terapias de controle social e “cura” da homossexualidade (2003, p. 47).

Até que ponto interesses econômicos não estariam moldando a nossa forma de ver a questão, em especial os de quem detém o poder de prescrever fármacos e os que comercializam fármacos? Bilek (2018) observou a influência de interesses financeiros de conglomerados farmacêuticos, instituições filantrópicas e personalidades milionárias nas pautas do ativismo trans, inclusive, através do financiamento estratégico de universidades americanas e canadenses. Na política, como Hadfield (2019) relata, o grupo britânico Lib Dems recebeu do laboratório Ferring Pharmaceuticals, que fabrica bloqueadores de puberdade, mais de £300.000,00, entre 2018 e 2019, somando £1.454.258,27 entre 2012 e 2019 (BBC, 2019). O Lib Dems se comprometeu com reivindicações de grupos trans, inclusive para menores de idade. Em seu site, le-se: “O direito de pessoas transgênero — e especialmente crianças transgênero — de receber os cuidados médicos adequados está cada vez mais sob ameaça de múltiplas frentes” (LGBT+ LIBERAL DEMOCRATS, 2015).

5 Considerações finais

Os estudos indicam que sujeitos homossexuais e bissexuais são parte significativa dentre os que receberam e recebem diagnósticos do que se denomina atualmente incongruência de gênero. Apesar da despatologização formal da homossexualidade em 1973 pelo DSM, muitos destes sujeitos ainda são, na prática, medicalizados através desse diagnóstico e das intervenções corporais. A chamada “afirmação de gênero” vem acontecendo cada vez mais cedo, adequando menores de idade à heteronorma antes mesmo que eles tenham tempo para se perceberem, ou não, como gays, lésbicas e bissexuais. Isso nos faz pensar se o processo medicalizador que se desenvolveu a partir do século XIX com o objetivo de “curar” homossexuais — em vão, obviamente — continua vigente e também se não estaríamos individualizando em diagnósticos questões coletivas como a dificuldade de acolhimento por parte das famílias, escolas e sociedade em geral das meninas e meninos “fora da caixa”. Convidamos a comunidade acadêmica a refletir sobre este tema e se engajar em práticas que protejam a humanidade, a saúde e os afetos de crianças, em especial das que desafiam os padrões estabelecidos.

[3] Entre outras, as Diretrizes para os cuidados primários e de afirmação de gênero de pessoas trans e não-binárias de gênero, da Universidade da Califórnia (DEUTSCH, 2016), e o Parecer n.º 8 de 2013, do Conselho Federal de Medicina.

[4] Ver: <http://www.nocorpocerto.com/efeitos-colaterais/>.

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Gays Pela Abolição de Gênero

Gays pela Abolição de Gênero (antiga Gay AntiQueer) é um coletivo formado por homens gays alinhados por ideais materialistas e abolicionistas desde 2015.